
Muda algo quando uma pessoa se apaixona?
Refiro-me à interacção com o exterior, com o meio ambiente, com o ecossistema.
“Nada!”, dirão os cépticos...
“Absolutamente nada!”, acrescentarão os radicais...
Muda muito, muda tudo, digo eu.
Senão vejamos...
Subitamente o tempo que estava nebuloso, adquire uma claridade única, radiosa, musical, com cambiantes e tonalidades dignos de uma obra de arte.
O pássaro que todas as manhãs incomodava, invariavelmente com o mesmo grasnar, inevitavelmente à mesma hora, transmuta-se num fabuloso canário, detentor das mais belas penas, um quase arco-íris e capaz de chilreios paradisíacos. Passa a ser um belo confidente, testemunha viva de um processo que se pretende que avance com afecto, assertividade, capacidade de investimento e boa disposição.
Aquela aresta assassina de uma determinada mesa onde, todas as manhãs se bate com o dedo mínimo do pé, gerando uma explosão de vernáculo, dor e lágrimas, transforma-se num original fragmento de design e aprende-se a evitá-lo, com alegria e satisfação, principalmente por ergonomia da dor.
Quando, de manhã, a água quente para o duche falta, por uma qualquer falha do sistema o que constituiria um infindável e pesado processo de irritação, acaba por gerar uma gargalhada e, por vezes, uma reflexão sobre os benefícios para a saúde do uso de água fria no banho matinal...nos mais afoitos chega a ser o momento alfa que despoleta a decisão inabalável de nunca mais voltar a inebriar-se com os vapores de um banho quase turco e turvo que, de deliciosos, se transformam em nefastos.
Se faltam os iogurtes, o leite ou o pão para o pequeno almoço, incómodo que, ao acordar, assume proporções dantescas, acaba por ser motivo para uma re-engenharia de comportamentos no sentido de arquitectar uma outra solução que pode, inclusive, passar por um chá de que jamais se gostou ou até por aquelas bolachas integrais que, num momento de desvario, cedendo às manobras maquiavélicas do consumismo, se tinham adquirido numa grande superfície e até então se encontravam atiradas, abandonadas para um canto da despensa, antecâmara do lixo.
O acto de vestir, de tão maquinal, adquire outras tonalidades, gerando prazer e uma nova capacidade, anteriormente desconhecida, de gestão das peças no armário e o resultado final, até então maquinalmente considerado desastroso, passa a ser recebido com um sorriso de satisfação, orgulho e vaidade.
O vizinho rabugento que todas as manhãs teima em não cumprimentar acaba por ser objecto de desculpabilização, alvo de atenção e compreensão, tornando-se quase simpático, vítima, talvez, de uma qualquer maleita que incomoda, inibe, indispõe e justifica.
Se a empregada da limpeza do prédio teima em deixar o tapete da entrada torto ou fora do sítio, passa a ser encarada como saborosamente pitoresca.
E, de repente, sai-se para a rua.
Aqui sim, verifica-se a grande, a enorme mudança.
A cidade de cinzenta, feia e velha adquire novas tonalidades e arquitecturais edifícios, detentores de deliciosos pormenores nunca antes vistos, apercebidos e saboreados.
Os rostos da multidão, frios e inexpressivos, autênticos autómatos que, todos os dias, como um ritual automático, se entrecruzavam, passam a gerar interesse, tornam-se simpáticos, peças de um cenário de poesia matinal.
A lata de refrigerante que ficou atirada para o passeio, numa atitude selvática de desleixo e desinteresse, passa a ser oportunidade para um acto ecológico, contribuinte activo para a felicidade e a qualidade da vida ambiental.
Os incontornáveis desperdícios intestinais do cão da vizinha da frente, deixados, indecorosamente, ao abandono no meio do passeio, adquirem requintes de humor.
A longa, fastidiosa, torturante viagem para o emprego, eternamente geradora de encontrões e atropelos anónimos e selváticos exibe, agora, cambiantes de roteiro mágico.
Passa-se a olhar para as características da realidade exterior, de um outro prisma, com uma nova capacidade de desfrute, com mais prazer, de forma quase poética.
O emprego, aquele sinistro antro para onde, todas as manhãs se arrastava, dolente, vociferando por nada e tudo, passa a ser um local atraente, com novas potencialidades e características, nunca detectadas, detalhes até então invisíveis.
Até o chefe se torna simpático e sorridente, bom conselheiro...
E quando o olhar pousa no rosto amado?
Aí atinge-se o verdadeiro clímax!
Ouve-se música celestial, tocam címbalos, harpas e trompetes, violinos de som cristalino, melodia de um Afecto que agrada, estimula, inebria, apaixona, delícia...
O objecto da paixão, enquanto entidade una e global, adquire voluptuosas formas, doce postura.
Uma borbulha testemunha de um qualquer ataque tardio de acne adquire graça, doçura, musicalidade.
E o sorriso?...Cristalino, obra prima.
E o olhar?...Profundidade, significante e significado nunca até então vistos porque, agora, se tornou querido.
E o toque?...O cúmulo do prazer.
Até o cheiro se torna mágico.
O que muda, então, por alguém se apaixonar?
Tão só e apenas...Tudo!
Manuel Damas in "O Primeiro de Janeiro" a 15-6-08
Por isso ser tão fácil identificar o estado de enamoramento em alguém. Toda a forma de estar com os outros se altera.
ResponderEliminarMa.ra.vi.lho.so!
ResponderEliminarNão há nada mais enebriante que o amor... nem os mais finos licores!
Muito boa semana!
Ó Professor até ouvi tocar os sininhos e concordo, muda muita coisa, em especial o estado de ânimo, agora o raio da vizinha ai essa não muda mesmo :)))))
ResponderEliminarBeijo dos bons
l'amour, l'amour... as endorfinas...ai,ai...
ResponderEliminarmuda tudo sem dúvida!
ResponderEliminarquando ando a passear, até dou por mim a sorrir ou a rir sozinha ao lembrar-me de coisas que a pessoa disse. acredito que as pessoas à minha volta pensem "que tolinha a rir-se sozinha" LOL
mas depois, o sorriso desaparece quando me apercebo que afinal estou sozinha e a pessoa está longe...
lindo texto!
bjinhos ;)
Precisamente...
ResponderEliminar:)))))))))
Beijinho
uma deliciosa semana para si também, maf...
ResponderEliminarA vizinha fica meenos medonha, ola
ResponderEliminar:))))))))))))))
Beijitos
Pois...o problema é mesmo das endorfinas, Sandra!
ResponderEliminar:))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))
E das feromonas...
C'est la folie de l'amour, maczinha...
ResponderEliminarUma magia encantada...
olá Professor :))))))
ResponderEliminarSabe, acho que está deliciosamente, irremediavelmente...Apaixonado!
Beijo, melhor 2 beijos, ora 3 e não se fala mais nisso.
Que bom voltar a ler os seus textos. Inspira para a vida. Espero que esteja a sentir isso tudo e muito mais que ainda fica por dizer. O Amor e a Paixão são estados de graça que tornam " Tudo mais brilhante"
ResponderEliminarA Vida não espera...Vamos lá VIVER...AMAR e PARTILHAR "afectos", como tão bem sabe fazer!
Muitos, muitos beijinhos para si.
Quando estamos apaixonados entramos num estado de graça... e a vida surge em todo o seu esplendor!
ResponderEliminarBeijinhos com raios de Sol
Quem diz que não muda nada é porque nunca esteve apaixonado...
ResponderEliminarMuda tuuudo o que tão bem escreveu e se possível ainda mais.
Anda-se mesmo nas nuvens e canta-se" Singing in the rain" com o meior dos sorrisos.
Beijinhos, veludinhos e cetins apaixonados
Obrigado Nav, minha querida amiga...
ResponderEliminarUm beijinho grande
Só 3 coragem?
ResponderEliminar3 apenas?
Tão pouquito...
umbeijnho grande..
São deliciosos os seus raios de sol, CC...
ResponderEliminar"Singing in the rain"...uma melodia intemporal.
ResponderEliminarObrigado blue...
belíssimo texto...
ResponderEliminarde facto, o estado de enamoramento é um verdadeiro prozac!!
bjs
Olá Professor, passei para lhe deixar um beijinho! Se não for antes, vemo-nos no jantar de dia 28!
ResponderEliminar:)
Cheira-me a "Love is in the air"... Será música, apenas?! (sorrisos)
ResponderEliminarAbraço e... Gostei muito do texto. Parabéns.
Cá para mim anda a Ler o SEGREDO.
ResponderEliminar"Ouve-se música celestial, tocam címbalos, harpas e trompetes, violinos de som cristalino, melodia de um Afecto que agrada, estimula, inebria, apaixona, delícia..."
ResponderEliminarÓ doutor, pela sua rica saude! E que acontece depois?
Abraço
P.S.: Não ligue, isto é só um ressabiado a reclamar da vida.
Belo texto...
ResponderEliminarRealmente muda mesmo tudo professor.
Mandei lhe um mail ha uns dias precisava que me respondesse esta semana ta bem professor?
Boa semana
E aquele beijo enorme:)
Obrigado lenib.
ResponderEliminarOs Afectos e, sobretudo, o enamoramento
tornam a vida diferente...
Beijinho grande
Lá nos veremos no jantar, lia.
ResponderEliminarUm beijinho grande
Não conheço esse perfume, LM.
ResponderEliminar:))))))))))))))))
Um grande abraço
Não, Zeuzinha...a menina até saber perfeitamente que eu ando a ler Eugénio de Andrade e não O Segredo...
ResponderEliminar:)))))))))))))))))))
Beijitos
Depois...é uma inevitabilidade...
ResponderEliminarOu convergente ou divergente.
e esta é a mais recente das minhas teorias, a Teoria da Inevitabilidade...mas um dia destes explicá-la-ei aqui.
Um grande abraço
Joana...já lá vou responder.
ResponderEliminarUm beijinho grande.
Fico à espera da sua Teoria da Inevitabilidade:)))
ResponderEliminarBeijinhos com raios de Sol
Um dia destes, CC.
ResponderEliminarUm beijinho grande
uauuuuuuuu
ResponderEliminarEste texto está no minimo intenso, absorvente, inquientante!
é assim tão fácil ver que é assim que eu sinto?? E eu que pensava que estava tudo escondidinho cá dentro!!! lol
Minha querida Pearl...penso que é universal.
ResponderEliminar:)))))))))))))))))))))))))