domingo, 31 de dezembro de 2006

2006







2006 está prestes a acabar.
Se quiser salientar os que considero os principais momentos do ano que agora termina, saliento três:

- A eleição de Cavaco Silva
- A execução de Sadam Hussein
- O caso Gisberta

A eleição de Cavaco Silva vale por si só. Pela primeira vez desde o 25 de Abril de 1974, os portugueses elegem, ainda que sem grande surpresa, para a Presidência da República Portuguesa, uma personagem conotada com a área centro-direita.
Assume assim as funções uma personagem com um perfil diferente do habitual, pragmático, quase esfíngico, de perfil austero. Em simultâneo surpreende a estrondosa derrota de Mário Soares, especificamente contra Manuel Alegre. Sai, deste modo, pela porta pequena, um dos nomes mais marcantes da vida política em Portugal, dos últimos trinta anos.

A execução de Sadam Hussein, sem sequer questionar se merecida, dado ter sido o principal responsável pelo assassinato de milhares e milhares de oponentes, surpreende pela rapidez com que foi efectuada assim como a facilidade com que se executa um antigo Presidente da República de um País... fica-se, no mínimo, com uma sensação de acidez e, talvez, de que o processo se desencadeou de forma estranhamente rápida...

O caso Gisberta... um assassinato a frio, prolongado no tempo, com requintes de extraordinária malvadez, que foi, assuma-se, branqueado de forma inaudita, pelos principais responsáveis deste país.

Um quase-conto de Natal...



Foi oficialmente declarada aberta a época natalícia!
Teve direito a discurso televisivo do Primeiro da Nação!
Acendeu-se, na capital, uma vez mais, aquela que dizem ser a maior Árvore de Natal da Europa e assim se iniciou, com pompa e circunstância, a que é considerada, de forma consensual, pelo menos na civilização ocidental, a época dos afectos... o período natalício.
As ruas, as montras das lojas, as portas e janelas das casas engalanaram-se de luz, de cor e de artefactos alusivos à data... dizem-me que maioritariamente de origem chinesa o que, uma vez mais, se vai traduzir num decréscimo prejudicial da produção nacional, mas isso é referência não adequada ao espírito de paz e amor que, oficialmente, se instala nesta altura.
Leio, inclusive, que foram movimentados, em Portugal, por hora, nessa semana, 8 milhões de euros, mas, de novo um pormenor de somenos importância...
É a época em que um pó de magia flutua no ar, fazendo do mundo um quase cenário mágico, em que é fácil sorrir, em que a todos se desejam Boas Festas, ainda que sem significado, mas em que a concórdia geral se parece instalar.
Também eu fui atacado por esse pó mágico que induz o sorriso.
Também eu fui obrigado a andar satisfeito ainda que preocupado com as prendas que não tinha comprado ou em adequar os meus gostos a cada uma das minhas referências afectivas as quais, querendo agradar procurei, também, conciliar com os condicionalismos financeiros em que todos mais ou menos vivemos... ou sobrevivemos.
E assim, imbuído do tal espírito natalício, lá me decidi, por fim, a enfrentar a turba que, nas ruas, dia após dia, ondula, na tentativa vã de tudo comprar.
Percorri ruas, invadi as várias catedrais de consumo do nosso burgo, permanentemente perseguido pelo grasnar das mais diversas formas histriónico-musicais que, nesta época, os diferentes mecanismos de difusão lançam em ondas infindáveis para as ruas. Fui empurrado, acolhido por diversificadas versões de pais e mães natal que todas as lojas, maiores ou mais pequenas, decidiram em uníssono que deveriam utilizar, este ano, como se dessa forma seduzissem o maior número de incautos. E assim fui, supostamente acolhido pelas mais diferentes versões de sorrisos de plástico.
Já farto, quase a terminar uma insana procissão de fé consumista, imerso em sacos, ia a sair de uma das muitas lojas atafulhadas de gente com vontade de comprar este mundo e o outro...
Como que por maldição, tropecei numa manta enrodilhada de velha, já esquecida no chão, por ter perdido a sua função maior... aquecer!
Vociferando baixo, com medo que as câmaras que asseguram a civilidade me detectassem, pontapeei distraidamente a maldita manta que me tinha afastado da azáfama consumista quando, de dentro, saiu um grito. Acto contínuo soltaram-se dois olhos, grandes, enormes, assustados, da cor da dor...
A seguir ao olhar de um sofrido intenso surgiu um rosto de criança, nova demais para já não ter futuro. E, logo depois, apareceu um focinhito de cão rafeiro, abraçado e abraçando o miúdo, no duplo papel de protegido-protector.
E a lufa-lufa parou, estática...
Não foram precisas palavras, nem gestos, apenas a troca de um olhar profundo.
O meu, envergonhado por, sendo adulto, passar ao lado da realidade que a miséria e o sofrimento daquele miúdo me cuspiram no rosto.
O da criança, um misto de medo por ter sido descoberta, por se ver invadida na sua privacidade, a única que conhecia, a das ruas e ao mesmo tempo de fascínio pelos embrulhos coloridos e as fitas garridas que esbracejavam alegres e supérfluas, ansiosas por sair do aperto dos sacos que as confinavam.
Não sei quanto tempo passou, apenas mergulhei naquele olhar de uma outra realidade, pungente, que nada tinha de espírito natalício.
Fui acordado do torpor por uma sensação de fresca humidade... uma lágrima revoltada, envergonhada por ter sido detectada, ardia escorregando-me pela face.
Abria carteira e tirei dela o meu pedido sofrido de desculpas, maneira cobarde de esconder a minha culpabilidade... dinheiro.
Entreguei ao miúdo, não sei quanto, tão pouco interessa, apenas muito pouco enquanto pedido de desculpas por esta sociedade de plástico em que vivemos e fugi.
Fugi, atabalhoado, envergonhado, atrapalhado pelos sacos cheios de alegrias de plástico que, nas suas cores berrantes e preços caros, nada tinham de significado.
E na noite dos afectos, rodeado de papéis coloridos já rasgados e de fitas arrancadas com sofreguidão, voltei ao miúdo e ao cão e senti, de novo, os olhos mareados... até ao próximo Natal!
in "O Primeiro de Janeiro" a 31/12/2006

sábado, 30 de dezembro de 2006

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Quando Tu nao estas...



Quando Tu não estás,
eu não sei
o que digo,
faço,
sou!
Estou sem estar!...
Quando Tu não estás,
o mar perde a cor,
a música deixa de ter som,
o sorriso esvai-se,
o ar deixa de saber bem!
Quando Tu não estás,
o dia deixa de ter cor,
a noite perde a calma
e eu fico
só!
Quando Tu não estás,
a nossa cama fica grande,
enorme,
vazia de Ti!...
E eu vagueio,
pelas recordações,
pelo toque,
pelo sorriso,
pelo olhar,
pelo calor da Tua pele,
pelo sabor do Teu corpo!
Quando Tu não estás,
nada mais interessa,
nada mais existe!
Quando Tu não estás,
eu nao sei se estou,
apenas sei,
que não sou!
Quando Tu não estás,
amor,
nada é como é!
Quando Tu não estás,
eu também não estou!

O barulho das unhas a riscar um quadro de ardosia


Cecil Adams, dos arquivos da Straight Dope, descobriu um estudo científico que tenta justificar a repulsa que a maior parte dos humanos sente quando ouve o ruído de unhas a raspar num quadro de ardósia.
O ruído é de uma frequência elevada e aguda, tornando-se quase universalmente irritante.
A repulsa sentida parece justificar-se pelo facto de que a frequência do ruído produzido pelas unhas no quadro é idêntica à do grito de perigo dos macacos Macaque.
A teoria defende que os nossos antepassados usavam um tom similar como grito de alerta.
Seria por isso que os humanos ainda reagem dessa forma à referida frequência de som.
É mais uma prova antropo-sociológica de que ainda estamos na caminhada evolutiva.
Por estranho que pareça, eu sou daqueles que não se sentem afectados por este ruído...
Será possível tirar alguma conclusão científica? :)

quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

2007




Para onde vais Portugal?

segunda-feira, 25 de dezembro de 2006

Dia de Natal...



Se hoje é Dia de Natal, como é possível que isto ainda aconteça?
Se é, mundialmente, o dia da fraternidade,da solidariedade, da paz, da igualdade, da capacidade de olhar para o lado e sorrir, do dar as mãos...como é possível que ainda haja casos como este, no Dia de Natal?
Porquê?

domingo, 24 de dezembro de 2006

Ceia de Natal...



Digam o que disserem, eu sou assim!...
Será kitch?
Não me interessa!
Adoro a ceia de Natal!
Adoro os rituais, o bacalhau cozido, o perú recheado, os doces, os doces, os doces e os doces!!!
Delicio-me com o bulício da troca de presentes, a lareira acesa e, no fim, as conversas sérias, agarrado a um bom cognac.

Compras de Natal...



Devidamente "apetrechado"...fui comprar as prendas de Natal!
Depois de uma tortura infindável consegui comprar tudo e para todos... Arggghhhhhhhhhhhhhhhh...

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Espirito natalicio...



E já que o espírito é natalício,não resisti a usar uma outra versão do Pai Natal, que me enviaram e que achei, no mínimo, diferente...

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Gripe!!!




Estamos na época delas e eu, como tantos outros, também fui atingido!
Felizmente que a minha já está de partida!
Arrggghhhhhh....

segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

O "post" anterior parecia premonitorio...

O 5º PODER...



Sem dúvida um poder de incomensuráveis dimensões.
Talvez, se organizado, tão só e apenas... o NOVO PODER !

domingo, 17 de dezembro de 2006

Dois Pais, Two Fathers, Twee Vaders (Letra em Português)

Também porque estamos em época natalícia...

u2 - Avé Maria

Porque estamos em época natalícia...um momento delicioso...

RIVOLI, RIO E LA FERIA...



Dizem-me que Rui Rio entregou a gestão do Rivoli - Teatro Municipal a Filipe La Féria.
Não conheço Filipe la Féria, o que me liberta de possíveis condicionantes de afectos.
Conheço Rui Rio e nem sempre concordo ou concordei com diversas medidas que tem executado.
A Revista nem sequer é o género teatral que aprecio.
Prefiro, todavia, o Rivoli aberto ao povo, com sala cheia, do que entregue a meia dúzia de intelectuais de pacotilha, suposta elite de esquerda empoeirada que, cristalizada no tempo, ainda grita pelas liberdades de Abril, não percebendo que tal momento, com lugar de direito na História e inolvidável...já aconteceu no século passado!
Prefiro um Rivoli de bilheteira esgotada do que frequentada por algumas dezenas de supostas mentes brilhantes, fascinadas com o seu próprio umbigo, oráculos isolados no espaço e no tempo, debitando discursos de intelectualidade oca e obsoleta para quem panos brancos em palco e frases de culturalidade duvidosa, porque incompreensível, levam a "orgasmos metafísicos"!

BELEZA SUBLIME...

Do “Eu, Carolina”, ao Mário do Big Brother – para onde caminha a sociedade dos afectos?



Nos últimos anos a Sociedade Global tem vindo a conseguir saltos qualitativos evidentes em diversos sectores.
Obviamente que, em simultâneo, tem vivenciado momentos de involução mas, em súmula, o resultado parece ser francamente positivo.
Ainda que a uma velocidade diferente, adveniente da idiossincrasia lusitana, também Portugal tem evoluído, nitidamente, em muitas áreas. Basta referir, a título de exemplo, o Relatório Mundial da Infância 2007, apresentado pela UNICEF e que aponta Portugal como um dos países do Mundo com mais baixa taxa de mortalidade infantil (5:1000 em 2005), sendo o 13º em 180. E a Taxa de Mortalidade Infantil é considerada, universalmente, como um índice de desenvolvimento de um país! Existem, contudo, sectores em que a situação não é tão promissora. A título de exemplo, refira-se a voracidade cada vez maior que a população portuguesa evidencia pela pequena intriga, pelo escândalo, manifestação de um quase primário voyeurismo, inter pares. Tal fenómeno que, em caso individual pode configurar um diagnóstico de parafilia, em termos de sociedade nacional, afigura-se como quase vampiresco ter prazer em conhecer os pequenos escândalos das personagens públicas.
Quando George Orwell escreveu o “1984” e, personificando no chavão “The Big Brother is watching you”, idealizou uma realidade virtual na qual a população mundial estaria a correr o risco de massificação, qual robotização imposta, em que tudo e todos seriam permanentemente vigiados por câmaras de filmar, ao serviço de uma qualquer entidade superior, falhou rotundamente na previsão.
Na realidade, o que se tem assistido, e o caso português é paradigmático, é ao desnudar público de vícios e virtudes, de pequenas-grandes misérias de rostos conhecidos e dramas individuais de famosos. Basta recordar todo o circo montado em redor da morte da Princesa Diana de Gales ou mesmo da ligação pseudo-afectiva desenvolvida entre George Clooney e o seu robusto porco de estimação, ou ainda a opção do Papa Bento XVI pelo uso de calçado Prada...
No caso português, tal estratégia de procedimentos tem levado ao enriquecimento dos media, extravasando já o universo da imprensa dita cor-de-rosa e, a nível da população anónima, tem originado, com o tempo e de modo vertiginoso, a perda dos limites.
Pequenos dramas familiares, escândalos de alcova, episódios de corrupção e um sem número de pecadilhos que sempre existiram, e creio mesmo que nunca deixarão de existir, são atirados diariamente para a capa dos jornais e revistas, alimentando a voracidade pública e, fundamentalmente, gerando lucro.
Veja-se o caso que atingiu, uma vez mais, Jorge Nuno Pinto da Costa, através de mais uma das suas aventuras de alcova.
Nada me move contra Pinto da Costa, que não conheço pessoalmente e muito menos contra o Futebol Clube do Porto que, queira-se ou não, é um referencial desportivo nacional. Sempre me ouvi a defender a minha simpatia pelo FCP apesar de nunca ter sido um fundamentalista e ser, presentemente, um acérrimo crítico do Poder que o Futebol, enquanto instituição, tem no nosso País, em termos de manipulação de massas, por um lado, de exacerbação de fanatismos, por outro, e mesmo da promíscuidade existente entre o Futebol e a Política.
Todavia, e não esquecendo o acima exposto, não entendo como é possível publicar-se um livro, eventualmente vendável em tudo quanto seja superfície comercial, revelando e desnudando ao mais ínfimo detalhe, pormenores de intimidades, manifestações de afectos da vivência em casal.
Muito pior do que ficar a saber que JNPC sofre de flatulência, a título de exemplo, é que tal facto seja passível de ser escrito e, pior, de ser publicado e, mais dramático ainda, que gere histeria na população levando a que tal publicação esgote, em poucas horas, os diversos milhares de exemplares lançados para as bancas.
Tal facto deixa-me atónito!
Não sei, nem quero saber, os detalhes do trânsito intestinal de A, B ou C. Grave é que haja quem o escreva, por sua própria mão ou por interposta pessoa, mais grave ainda é que haja quem publique e, acima de tudo, quem compre.
Espanta-me a voracidade quase animalesca e lúgubre, pelos pormenores mais escabrosos, relacionados com a vida íntima das figuras públicas. Mas mais me choca a passividade e mesmo a cumplicidade que, muitas vezes, as ditas figuras públicas evidenciam, fazendo gáudio dos referidos pequenos episódios.
Sei que a Psicologia e as outras Ciências que estudam a mente humana explicam que o acesso ao pequeno escândalo, ao detalhe pecaminoso, à pseudo-inconfidência transmuta a celebridade de distante em próxima, vulgariza-a, humaniza-a, torna-a tocável, quase igual entre iguais.
Preocupa-me, ainda, que não haja limites para o que se publica e consequentemente se vende relativamente a outrém, descendo ao pormenor escabroso, ridículo, de opereta de fraca qualidade...A este tipo de escrita já se chamou, outrora, literatura de cordel mas, à época, era bem mais decente do que a produzida pela dita modernidade.
Espanta-me ainda que as entidades, nomeadamente as editoras, tenham perdido o conceito de ética profissional e não impeçam a publicação de revelações fétidas referentes à intimidade e à conjugalidade.
O mau gosto tem de ter limites e se tal não é gerado de motu proprio, então que o institucional aja como entidade reguladora!
A isso chama-se decoro e, quiçá, pudor!
E isto remete-me para o outro vector do título desta crónica.
O episódio de criminalidade violenta protagonizado pelo Mário do reality show “Big Brother”. Com a vulgarização dos programas televisivos que desvendam os momentos de intimidade, janela aberta para o interior vivencial de rostos desconhecidos, foram alcandorados aos designados “5 minutos de fama” personagens que não estavam, nem teriam de estar, preparados para tal facto e, como tal, não dispunham de estratégias de coping para interagir com o estrelato.
As luzes da ribalta estonteiam, ofuscam, mas também criam dependência da adrenalina que uma suposta fama gera e, quando os holofotes se apagam e a pseudo celebridade se confronta com a sua realidade nua e crua, a gestão do abandono pode tornar-se dramática. Foi o que se passou com Zé Maria, outra personagem big brotheriana cuja fragilidade psicológica por diversas vezes gerou tentativas de suicídio, quando gélida e asfixiantemente foi confrontado com o peso do anonimato.
O mesmo se terá passado com Mário que, também não sabendo gerir com distanciamento a fama fugaz proporcionada por um momento televisivo se inebriou e quando confrontado com a realidade descompensou, enveredando pela marginalidade, furto e violência, terminando com a sua detenção e posterior julgamento.
Talvez a distância do “Eu, Carolina” aos “tás a ver” não seja assim tão grande e, afinal, não passem ambos, de duas faces de uma mesma moeda...a da cruel realidade em que se está a transformar a sociedade, despudoradamente plástica, sedenta de escândalos e possuída pelo desejo insano de desnudar e de devorar as pequenas intimidades, as misérias e os dramas de cada um dos Outros.
in "O Primeiro de Janeiro" - 17/12/2006

SÉCULO XXI: SEXUALIDADE E ENVELHECIMENTO



Urge repensar a situação dos Mais Velhos, em Portugal!
Mas esta não pretende ser uma frase circular nem tão pouco uma afirmação redundante.
Ainda é normativo que, em Portugal, os Mais Velhos sejam encarados como uma faixa etária não atractiva financeiramente, nomeadamente pelo Marketing e pela Publicidade, que os ostracizam porquanto assumem como “verdade oficial” que a sua desvinculação laboral é sinónimo de parcos recursos financeiros... o que nem sempre é verdade mas, acima de tudo, se afigura incorrecto e injusto.
E esta coitadificação daqueles que representam a memória viva do passado generaliza-se a todos os campos, tornando-se quase impositiva, inclusive na área dos afectos. O Mais Velho, enquanto refém da titulação oficial de “incapaz e debilitado”, parece perder o direito ao afecto, subsequentemente o direito ao desejo e indissociavelmente ao prazer!
Mas o ter atingido a terceira ou quarta idades não pode continuar a ser um estigma!
Não me atrevo sequer a negar, porque seria uma inverdade científica, que existem alterações anátomo-fisiológicas provadas e comprovadas e inerentes ao avanço da idade! Contudo, reconheço que através de uma reengenharia de comportamentos se consegue um adequado desempenho, gerador de gratificação e prazer em qualidade e dignidade.
Os Mais Velhos, porque também mais experientes, adquirem através da vivência dos afectos, com maturidade, a capacidade de re-inventar o prazer, evolução essa que, ao invés de ridicularizada, deve ser acompanhada, acarinhada e estimulada.
Também pelo acima exposto urge desmistificar a verdade pretensamente absoluta de que, nos Mais Velhos, a actividade sexual, se existente, deve ser direccionada para a meiguice e para o carinho, como finalidades absolutas e exclusivas... até porque a desvinculação laboral e a menopausa, entre outros determinantes, permitem o direito ao prazer, já não condicionado por factores como a falta de tempo ou mesmo o receio, sempre castrador, de uma gravidez não desejada.
Impõe-se, deste modo, revogar as crenças e os tabus que a Sociedade e as Culturas associaram, voluntária ou involuntariamente, ao processo de envelhecimento, especialmente no que concerne à vivência das Sexualidades!
O envelhecimento pode implicar um desgaste relacional e mesmo alguma limitação, em termos de desempenho. Existem, sem dúvida, terapêuticas que secundariamente induzem inibição do desejo e prejudicam, ainda que de forma indirecta, a concretização. É inegável a existência de patologias que, ainda que de forma secundária, prejudicam o desempenho e se tornam inibidoras, como as patologias respiratórias, as osteo-articulares e as neoplásicas, entre outras. Todavia, tornar as referidas condicionantes sinónimo de incapacidade, défice, perda ou impossibilidade é, para além de uma veleidade, impor limitações desnecessárias, imprecisas, traumatizantes e prejudiciais.
É obrigatório que relativamente aos Mais Velhos seja permitido e incentivado o direito a compreender, assumir e integrar, com toda a dignidade, as mudanças corporais, munindo-se de novos recursos e estratégias, mantendo sempre presente que, em qualquer fase da vida, está implícita a possibilidade de uma vivência sexual em plenitude, satisfatória e prazerosa, efectuando um upgrade qualitativo, através do uso das mais variadas formas de vivenciar os afectos.
Assumindo as alterações anátomo-fisiológicas com maturidade e tranquilidade e respeitando, sem falsos pudores, os novos limites que o corpo coloca, os Mais Velhos podem alcançar, em pleno, o direito à tríade Afectividade-Intimidade-Sexualidade, de forma orgulhosamente coerente.
É, todavia, fundamental que a comunicação e o diálogo em casal se mantenham, até para que seja possível a constatação, em concreto, de quais as estratégias mais adequadas ao funcionamento na intimidade e à partilha do prazer.
Mas, à Sociedade Civil, em simultâneo, deve ser imputada a obrigação de encarar esta faixa etária com a naturalidade merecida, para que aos próprios seja permitido continuar a vivenciar os afectos, de forma assumida e dignamente reconhecida.
in CadernoSaúde

sábado, 16 de dezembro de 2006

"A Rainha"



O filme está interessante.
A interpretação feminina é fabulosa...a não esquecer!
Certamente uma forte candidata a receber o Óscar para a Melhor Actriz Principal...

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

"ENIGMA SEM FIM"- Salvador Dali



Será com este quadro de Salvador Dali que iniciarei amanhã, a conferência solene de encerramento das Jornadas Nortenhas de Sexualidade Humana, no IPO do Porto e a que dei o título de "A Virgindade e o Bailado dos Afectos - determinantes, mitos e realidades "...
Polémico q.b...

A prova fetida da incomensuravel estupidez humana!

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

Carmina Burana - Era Band - The Mass

Uma adaptação fantástica da Carmina Burana, feita pelos ERA...

Grrrrrrr.............

domingo, 10 de dezembro de 2006

JORNADA NORTENHA DE SEXUALIDADE HUMANA

Mais uma conferência para que fui convidado, no próximo dia 14 de Dezembro, no IPO, no Porto.
Desta vez com um tema tão arriscado como sedutor :
"A Virgindade e o Bailado dos Afectos-determinantes, mitos e realidade"...
Este ano é a 12ª...500 que fossem!
É a minha "guerra" pela Educação Sexual que, parece ser interminável!
Os diversos agentes envolvidos, na maioria, concordam com a Educação Sexual nas Escolas!
O poder instituído, por vezes sim, outras não, muitas vezes nem por isso, outras tantas, qualquer dia e, quais baratas tontas, persistem na ridicula demência de negar algo que faria evouir o grau de cidadania da população portuguesa...Até quando?

O meu Porto...que tanto amo!-2



Um outro delicioso olhar sobre o Porto.
A Foz vista de um outro ângulo, enquadrada pelo mar, revolto mas com tanto poder para relaxar e acalmar das agruras de ser e estar...Vivo

sábado, 9 de dezembro de 2006

sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Mariza



A mais bela voz portuguesa da actualidade!

A Voz...AMALIA!

Gioconda, de Leonardo da Vinci




Talvez a pintura mais famosa de todos os tempos...

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

Stonehenge...o eterno misterio!

O numero da vergonha!

3 200 000 000 !
Não!
Não é nenhum codex cabalístico!
Nem sequer é a chave miraculosa de um qualquer sorteio da moda, do género do euromilhões, do totoloto ou quejandos!
Não!
Tão pouco estou na senda da Maya e, com isso, capaz de proporcionar a todos os que me procuram, supostas soluções miraculosas para os pequenos dramas diários, aldeões globais que somos deste território que se diz “Terra de Humanos”!
Bem...
Penso ser já altura de esclarecer.
Refiro-me a euros... três mil e duzentos milhões de euros ou, melhor dizendo, como o meu professor da escola primária me ensinou, um dos tais que a Ministra da Educação faz questão de considerar, directa ou indirectamente, uma cambada de incompetentes, três biliões de euros.
Permitam-me o jogo matemático de converter em escudos... aliás, para facilitar, vamos falar em contos.
Não os contos de encantar, aqueles que este Governo tanto nos recitou, que não a mim, mas enfim, e que tanta gente encantaram na campanha eleitoral.
Não!
Refiro-me aos outros, aqueles que tantos nos custa a receber ao fim do mês.
Pois...
Desses com que pagamos todas as nossas despesas.
640 milhões de contos!
É esse o número da vergonha!
640.000.000 de contos!
É quanto vai custar o megalómano projecto do novo Aeroporto da OTA!
Espero que esta designação não esteja relacionada com a pouco simpática expressão “Otários”...
E, ironicamente vão informando, quase em registo delirante, que 380 novos milhões de euros serão investidos no Aeroporto da Portela para a reconversão de uma estrutura que, em princípio, será para abandonar...
Mas está tudo louco ou serei eu que estou manietado por alguma visão delirante ou por um qualquer delírio esquizoide?
E fecham-se escolas, principalmente do interior, quando se continua de forma vergonhosa e hipocrita a discursar contra os anátemas da interioridade?!
E as escolas que não fecham e continuam a degradar-se, com estruturas obsoletas, sem materiais pedagógicos e a sobreviver nos limites?!
E fecham-se Maternidades, enquanto se continua de modo contraditório, a defender em praça pública, uma suposta preocupação com os Cuidados de Saúde Primários?!
E destroem-se projectos fantásticos, como o da Festa da Música que, se mais não fosse, era um projecto de Cultura e que dava visibilidade para o exterior, nomeadamente internacional, com isso atraindo investimentos?!
E as Autarquias que estão com os orçamentos completamente esgotados e sem qualquer vislumbre de dotação do Governo Central?!
E as Empresas que vão fechando calmamente?!
E o Desemprego que continua assustadoramente nos 7,2% ?!
E as listas de espera para Cirurgias e Consultas que vão aumentando de forma imparável porque os recursos humanos da Saúde se tornam cada vez mais escassos, não existindo verbas para abertura de novos concursos e para a criação de novas vagas...
E as Comissões de Protecção de Menores que continuam exíguas, sem recursos, servindo de arma de arremesso sempre que mais uma Fátima ou uma outra criança qualquer for violentada, assediada, maltratada, violada?!
E os Tribunais que já declararam, oficialmente, que esgotaram as verbas para pagar aos fornecedores?!
E os idosos, que em fim de vida, depois de anos e anos a trabalhar, vêem subitamente as suas parcas reformas, de novo reduzidas, agora com mais um aumento de impostos?!
E os deficientes, que já violentados por força do destino, das suas incapacidades e do ostracismo da Sociedade em geral, se vêem, agora eles, vítimas de uma falta total de decência, de sensibilidade e de solidariedade social, atacados com um aumento da carga fiscal, através de uma maquiavélica redução das possibilidades de dedução?!
E tantos e tantos outros exemplos gritantes de dificuldades...
Mas para o projecto faraónico de um novo aeroporto, já há verbas!
Especificamente para algo que, para aqueles que passam fome, porque em Portugal passa-se fome, não passa de uma visão jamais tangível...
E dizem-nos, com a maior displicência, que os custos deste projecto vão ter que ser revistos em alta porque o dito Jardim Zoológico da vaidade de muitos, que não eu, só vai poder abrir ao público, já não em 2012 mas apenas em 2017... e, calmamente, os custos vão derrapando, num país em que nada nem ninguém tem responsabilidade sobre nada nem ninguém.
E ainda por cima com a desonestidade gritante de amarrar a esse mesmo polvo monstruoso outros governos futuros.
Sim, porque em 2017 não será este o Governo que estará em funções... disso tenho a certeza absoluta!
in Revista do SIPE - Dezembro 2006

domingo, 3 de dezembro de 2006

O Canto Luso...

Acabou o fim de semana!



Acabou o fim de semana!
E de novo, aldeões globais, cá iremos, quais autómatos, formigas desta aldeia global, voltar às pequenas realidades de cada um de nós!
Vale, porque, para a semana, há mais deste fim de semana prolongado que tão rapidamente passou.

Do Amor ao Odio


Como se passa do amor à agressão física, à violência, ao ódio em relação?
São juras de amor eterno que se extinguem, sentimentos que se esfumam, mas, principalmente, limites que se ultrapassam, muitas vezes sem tempo, oportunidade ou vontade para a reflexão e consequente inflexão...
E esse involuir não é súbito, é gradual.
Lentamente o “amor sem fim” transforma-se em violência, primeiro pensada e logo negada, depois latente ainda que não assumida e finalmente, entra-se num percurso em espiral.
Os suspiros de paixão são substituídos por urros de ódio, mesclados com brutalidade. De forma sarcástica poder-se-ia dizer que é a passagem do sinalzinho delicioso à verruga horrenda!
E essa é a marca indelével do destruir de uma relação!
Num processo de desgaste, quase nunca detectado e muito menos assumido, primeiro cai o amor, depois a amizade, seguidamente o respeito, ingrediente imprescindível numa relação a dois, de afectos. Instala-se, por fim, o ódio monstruoso, intolerante, repulsivo e violento, que alastra sem fim, corroendo tudo em redor.
Assim se percorre o caminho descendente e, de forma involutiva, passa-se do amor ao ódio, numa relação afectiva que ninguém se lembrou de alimentar.
Num relacionamento em que alguém ou ambos se esqueceram de que, acima de tudo, seria primordial conservar, para além dos afectos, a capacidade de diálogo e, condição sine qua non, o respeito a que ambos os intervenientes, pelo menos enquanto seres humanos, têm direito, em plenitude.
Gradativamente os carinhos e as carícias foram caindo em desuso. Depois instalou-se o silêncio na relação e por fim, o isolamento imenso que se sente numa situação que ameaça degradar-se até ao fim.
Por fim, surge a revolta contra uma realidade que se instalou e principalmente, contra o alvo que já foi o foco de todas as atenções, carícias e meiguices.
À medida que a situação se instala e, progressivamente, se vai degradando, surge a sensação de insustentabilidade, de impaciência, de intolerância, de beco sem saída, claustrofóbico, esmagador, asfixiante.
Quando se perde a racionalidade para análise das situações, quando não se vislumbram soluções e essa sensação se torna, só por si, ainda mais desgastante, surge a revolta, primeiro latente, mas que vai fazer aumentar ex-ponencialmente o stresse, a angústia e, simultaneamente, diminuir a procura de soluções e extinguir a capacidade de racionalização dos problemas e dos factos.
Por fim, num qualquer momento de fúria incontrolada, de um pico major de adrenalina, de um gradiente altamente explosivo de conflitualidade, deixa-se de pensar, de raciocinar e avança-se, de forma inclemente, para a irracionalidade, permitindo que venha ao de cima o lado animal que constitui a base do iceberg do ser humano, indissolúvel ponte com o seu passado antropológico... a era da besta.
Assim se percorre o percurso negro que vai da carícia à agressão.
Mas não se pense que este drama é exclusivo de um qualquer estrato sócio-cultural, de um determinado nível económico ou específico de uma faixa etária. É uma problemática transversal à sociedade, não escolhendo faixas nem clusters.
Todavia não é apenas a violência física que urge referenciar. Existe também a violência psicológica, não tão visível porque, em princípio, não deixa marcas físicas, nem causa hematomas mas que, muitas vezes, se torna bem mais corrosiva.
Recordo, há uns anos atrás, uma das frases mais violentas psicologicamente que ouvi proferir em contexto de consulta de Sexologia, em casal.
Encontrava-me perante um casal que tinha recorrido à consulta porque o homem sofria de disfunção eréctil, receando estar a desenvolver um quadro de impotência.
Depois de o ouvir detalhadamente, solicitei a presença da companheira, para uma consulta em conjunto. No dia aprazado os dois chegaram e a mulher, entrando no consultório altaneira, fustigou o companheiro de forma castradora: “O meu marido pediu-me que viesse com ele à consulta mas, sinceramente, não sei o que vim cá fazer... Ele não consegue e não”!
Esta frase, traduziu uma violência psicológica atroz e nunca mais a esqueci, enquanto exemplo de que a violência psicológica consegue, muitas vezes, ser bem mais invasiva, danosa e castradora do que a própria violência física.
in "O Primeiro de Janeiro" a 3/12/2006

sábado, 2 de dezembro de 2006

"Le Petit Prince"



Um dos mais belos livros jamais escritos...
A reler, sempre!

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

quinta-feira, 30 de novembro de 2006

Olhares que fascinam...

Porque a memoria nao deve ser esquecida, sera justo relembrar o assassinato de Gisberta a horas do Dia Universal da Luta conta a Sida

Lamento, mas recuso-me a fazer parte da maioria silenciosa!
Lamento, mas não vou seguir a estratégia do politicamente correcto, omitindo a questão e preferindo sentar-me numa esplanada a saborear um gelado, em frente ao mar, enquanto debito generalidades, sobre os temas da actualidade, seguindo os ditames de uma consciência pública que se fragiliza e grita quando convém e se cala, quando mais conveniente é!
Lamento, mas não vou por aí!
Lamento, mas não vou assobiar para o lado, argumentando que “está calor”, “ninguém quer ler crónicas desagradáveis e pesadas, quando o calor aperta e o convite é explicito para o divertimento e a displicência”. Não usarei esse argumento falacioso!
Lamento, mas nem sequer me vou atrever a alegar que justiça foi feita, porque eu sei que não é verdade!
Lamento, por Gisberta.
Lamento, por os media terem dado muito menos divulgação à resolução do colectivo de juízes do Tribunal de Família e Menores do Porto que decidiu as medidas que iriam ser aplicadas aos assassinos de Gisberta, do que a eventos bem menos importantes, talvez porque vendem mais ou porque não interessaria acordar uma consciência fascinada com o conflito israelo-libanês ou com a problemática dos incêndios em Portugal! Sem querer fugir ao fio condutor, mas porque é uma observação que urge ser feita e que, estranhamente não vi ninguém efectuar... Alguém reparou que durante o Mundial de Futebol, praticamente não houve incêndios em Portugal quando, por diversas vezes, os termómetros atingiram, em várias localidades, os 30 e os 40 graus?
Mas deixemos este reparo breve, quase em nota de rodapé e regressemos, uma vez mais e sempre, ao caso Gisberta.
Lamento, por tudo isto, mas e principalmente, por Gisberta, que não conheci, mas em quem não deixo de pensar, após o seu brutal assassinato, com requintes de malvadez, por gente que o Sistema decidiu inocentar. E se por acaso me tivesse esquecido do animalesco assassinato, se por acaso não continuasse a usar o exemplo, como “case study” em todas as conferências que efectuo, com o intuito de efectuar um permanente remember me, se por acaso, dizia, me tivesse esquecido... tinha sido violentamente acordado para a realidade, da forma mais insana e hipócrita, aquando da decisão do tribunal... aliás, cumprindo a prévia decisão do Sistema!
Os 13 assassinos foram condenados (premiados) a medidas tutelares de internamento em centros educativos por períodos que vão dos 11 meses – aplicada a cinco assassinos – aos 13 meses – aplicada a seis outros assassinos –, todas elas cumpridas em regime semi-aberto. Ainda dois outros foram obrigados, durante um ano, a frequentar a Escola e a ter acompanhamento educativo... Ocorre-me perguntar, sarcasticamente, como se pode condenar alguém a frequentar a Escola... quando a mesma frequência já é obrigatória por Lei... Ou desconhecerá o Sistema que o ensino escolar é obrigatório, nas faixas etárias referidas?
É este o preço de uma vida, no caso em apreço de Gisberta, nascida a a 5 de Setembro de 1960 em S. Paulo, no Brasil e assassinada no Porto, em Portugal, em Fevereiro de 2006 e de novo assassinada, agora pelo Sistema, em Julho de 2006.
11 a 13 meses...
Lá bem no fundo, no mais recôndito do meu ser, eu sabia que o Sistema ia ganhar, perversamente... mas não queria acreditar.
Nem sequer detectei indícios quando o julgamento foi marcado em tempo recorde.
Tão pouco vislumbrei pistas do desfecho hediondo, quando alguns jornalistas foram anunciando, em tom de breve referência, que a audição das testemunhas iria ser feita muito rapidamente.
Lamento por tudo isto e por todo este tenebroso desfecho.
E ainda houve quem dissesse, do alto da sua suprema sapiência, que teria sido “uma brincadeira que correu mal”...
Uma brincadeira que correu mal?
Torturar, com requintes de extraordinária malvadez e perversidade um ser vivo, durante ininterruptos dias?
Esbofeteada, esmurrada, cuspida, insultada, violentada, penetrada com objectos contundentes, queimada com cigarros e por fim atirada para um nojento poço de vários metros de profundidade, ainda viva, foi uma brincadeira que correu mal?... E que apenas merece como discreta penalização 11 a 13 meses de internamento numa instituição de acolhimento, em regime semi-aberto?
O que teria sido preciso mais?
Prolongar a brincadeira, mais ainda?
Que tal esquartejar o cadáver... ou talvez comer-lhe as entranhas? Seria, ainda, uma brincadeira que foi longe de mais?
Mas o Juiz preocupou-se, também, em alertar para o facto de esta não ser uma sentença punitiva mas antes de socialização... E de Gisberta, alguém se lembrou dos simpáticos pormenores de socialização que durante tenebrosos dias os referidos assassinos se divertiram a ministrar a seu bel prazer, na tal brincadeira que correu mal?
Até os advogados de defesa, intervenientes directos nesta farsa, quiseram dar o ar da sua graça neste argumento felliniano, infelizmente bem real... um achou que devia processar o Estado Português, outro referiu que esta sentença permitia ao assassino encarar um projecto de vida...
Talvez Gisberta gostasse de ter podido encarar, também ela, um projecto de vida e não um pesadelo animalesco de morte torturada em que, certamente, muitos dos seus gritos uivados de forma sangrenta, foram cobertos pelo gargalhar animalesco dos seus algozes, todos perfeitamente conscientes do que estavam a fazer.
Lamento não ter ouvido, neste momento, muitas daquelas instituições, vulgo partidos políticos que, nestas ocasiões, se costumam arvorar em defensores exclusivos dos perseguidos e oprimidos... talvez tenham já entrado em época estival!
Lamento não ter ouvido a Igreja, enquanto instituição, teoricamente defensora máxima dos oprimidos, dos marginalizados, dos injustiçados, dos violentados, solidarizar-se com a vítima...
Lamento tudo isto que me enoja e enraivece!
Mas já podemos todos, de forma aparentemente tranquila, regressar à praia, cantando e rindo, para disfrutar os prazeres que uma estivalidade tranquila proporciona... apanhar sol, bronzear, mandar uns piropos, comer algum marisco, desde que o orçamento familiar o permita, discutir futebol e beber uns copos com os amigos... que tudo voltou à normalidade... o caso terminou, foi julgado e tudo ficou em paz.
Não!
Lamento, mas não é assim!
Lamento, mas em tranquilidade eu não fico... ia quase a escrever “enquanto justiça não for feita”... mas um esgar ácido de revolta mesclado com acidez e nojo toldou-me o sarcástico sorriso sofrido que se desenhava...
Que justiça?... a do Sistema?!
Lamento... mas não consigo entender nem esquecer!
in "O Primeiro de Janeiro"