domingo, 28 de janeiro de 2007

INTERRUPÇAO VOLUNTARIA DA GRAVIDEZ



Começo por afirmar, de forma frontal e tranquila, que no último referendo sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez votei Não!
Fi-lo, de forma activa, tendo assumido publicamente o meu voto, tendo participado num movimento que defendia o Não e tendo feito campanha empenhada e motivada.
Fi-lo, também, porque achava que diversas outras estratégias poderiam ser implementadas no terreno e de forma menos fracturante. Achei que era exequível e exigível institucionalizar o Ensino da Educação Sexual, também como forma pedagógica de fornecer aos adolescentes e jovens, de ambos os sexos, a informação/formação capazes de gerar competências no sentido da vivência das Sexualidades e dos Afectos em plenitude.
Fi-lo, inclusive, porque achei possível concretizar o apoio institucional à maternidade, quer em termos de uma rede estruturada de Cuidados de Saúde Primários, quer através de uma grelha de medidas de acção que concretizasse, de forma moderna, consciente e consequente, o apoio à mulher grávida. Toda esta estratégia de acção deveria ter como alvo principal o apoio à mulher em contexto gravídico, em tempo útil, com o intuito de impedir ou resolver as dificuldades psicológicas, económicas ou sociais com que, eventualmente, se confrontasse.
Fi-lo, ainda, esperançado na criação de um plano nacional que, de forma estruturada e consequente, apoiasse, em concreto, a mãe solteira.
Fi-lo por acreditar ser possível instituir um planeamento familiar, no terreno, efectivo e de forma condigna, promovendo o apoio atento e responsável às famílias, especificamente na gravidez indesejada.
Influiu também na minha decisão de voto o facto de considerar a legislação então em vigor e após o realístico alargamento até às 16 semanas, consentânea com uma postura preocupadamente cívica. A Lei preocupava-se em promover a exclusão de ilicitude, até às 16 semanas, se fosse considerado terapêutico em termos de reversão do perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher ou em resultado de violação ou ainda eugénico desde que existissem motivos concretos para prever que o nascituro viesse a sofrer, de forma incurável de doença ou malformação grave.
Foram todos estes argumentos, sem exclusão de nenhum, que levaram a que o meu voto fosse, de forma consciente e tranquila, Não!
Passados todos estes anos surge, de novo, o referendo sobre a mesma matéria.
Quero deixar bem claro que considero este referendo um acto de irresponsável cobardia por parte das entidades responsáveis!
Detentor de uma maioria parlamentar absoluta e confortavelmente recente, seria de todo expectável que o Governo legislasse, de acordo com as suas convicções, também nesta questão e decidisse, sem tibiezas, protegido, inclusive, pelos resultados eleitorais conseguidos.
Todavia assim não entendeu José Sócrates, preferindo atirar com o ónus da decisão para a rua, num tema tão delicado e fracturante como este, decisão que implicará, para além do mais, um desnecessário aumento da despesa pública.
Mas as asneiras não se ficaram por aqui, vindas de todos os lados.
Considero de uma incoerência total e, fundamentalmente, de uma demissão inconsciente relativamente ao acto público, a posição oficial do maior partido da oposição, o PSD ao, sobre este assunto, decidir Nim. E mais incoerente e frágil se torna a posição quando o próprio líder, Marques Mendes, decide produzir declarações tão controversas como as de declarar a IVG “um mecanismo de desresponsabilização social e sinal de facilitismo”. Não satisfeito prossegue considerando-a “um acto arbitrário e injustificado que destrói um ser humano”! Desculpe? Importa-se de repetir?!... Um “acto injustificado”? Mas será possível alguém considerar que, mesmo sendo a favor ou contra a IVG, uma mulher quando toma uma decisão destas o faz de forma injustificada?... Por esse andar, meu Caro Marques Mendes, injustificada se tornará, de forma dramática, a sua presença à frente do Partido que já foi o maior do País!
Passados todos estes anos, sou obrigado a concluir que, de todos os pressupostos que elenquei e que conduziram à minha tomada de decisão, praticamente nenhum foi cumprido!
Até porque a questão nuclear, no que à Interrupção Voluntária da Gravidez concerne, refere-se às razões e às condições que induzem uma mulher a equacioná-la. Independentemente dos milhares de argumentos e condicionantes que poderiam ser chamados à colação, em situação extrema não pode ser esquecida a possibilidade de se ter tornado insuportável a prossecução da gravidez, por razões pessoais, familiares, sócio-culturais, económicas, ou outras.
Acima de tudo, a mulher deve poder ter o direito de decidir, sem dogmatismos, se quer ou não prosseguir com a gravidez que evolui... dentro do seu próprio corpo!
Parece-me linear o direito básico fundamental a decidir o que alguém pretende para si, corpo incluído.
Convém, ainda, não esquecer que indissociável deste deve ser o direito da mulher a não ser criminalizada por uma decisão que, queira-se ou não, acima de tudo a fragiliza, magoa e tortura no mais íntimo do seu ser... e isso, nenhum referendo ou lei aliviarão, dado que ninguém opta por uma IVG de ânimo leve.
E não me venham com a falácia de que a IVG corre o risco de se tornar um método contraceptivo porque defendo que é fundamental, repito, imperioso mesmo, para que isso não possa ocorrer, que as menores, para realizarem uma IVG necessitem de uma autorização formal e consentida dos seus progenitores.
Nem sequer me aleguem que a IVG deve ser proibida por causa da Demografia porque a esse argumento, de tão débil e de extraordinária vacuidade, apenas sorrio com desdém!
Por tudo isto e...
Porque não acho que despenalizar a Interrupção Voluntária da Gravidez a torne tão vulgar como o uso de telemóveis, como referiu João César das Neves!
Porque não acho que as mulheres que cometem uma Interrupção Voluntária da Gravidez devam ser impedidas de ter, em caso de morte, um funeral religioso, por terem sido automaticamente excomungadas pela Igreja Católica, a mais grave das censuras eclesiásticas, como ameaçou o cónego Tarcísio Alves!
Porque não considero que a Interrupção Voluntária da Gravidez seja uma variante da pena de morte, como declarou D.António Montes Moreira, Bispo de Bragança-Miranda!
Porque não concordo com todos estes dislates e com todos os outros que irão ser produzidos, numa escalada violenta de intoxicação da opinião pública, em crescendo, até ao próximo dia 11 de Fevereiro!
Porque sou Homem e Pai...
Por tudo isto, em consciência, com dignidade e tranquilidade, desta vez vou votar Sim, a bem da Mulher, da Liberdade, e de Portugal!
in "O Primeirdo de Janeiro" a 28/1/2007

6 comentários:

Unknown disse...

São argumentos destes que eu gostaria de ter ver esgrimidos, desde que a questão se levantou. Isto sim, é explicar com serenidade e seriedade os porquês, neste caso do Sim.

Cinco estrelas.

Anónimo disse...

no outro dia enquanto via tv, ouço uma qualquer mulher dizer que se ocorrer a despenalização do aborto, então não se deverá mais denunciar casos de violência domêstica, de violência infantil etc...nem é preciso proferir aqui tudo aquilo que me apeteceu chamar àquela mulher...é triste...
vou votar pela 1ª vez nestes quase 19 anos, e espero que este seja um voto decisivo, pelo SIM, pelo direito das mulheres e acima de tudo, porque ninguém é dono de ninguém a não ser de si próprio

Cristina disse...

Seriedade é o que faz falta nesta questão, mas tudo vai mal começando pela decisão de se fazer um referendo ... será que com os votos contados, a decisão não acabará por ser a mesma de há uns anos atrás?

Sem máscaras, mais uma vez, fala-se de afectos;
obrigada, professor!

Manuel Damas disse...

É isso precisamente que me preocupa, Maria José...a falta de seriedade com que está a ser discutida esta questão!
Os argumentos muitas vezes são falaciosos e outras vezes são, simplesmente, falsos!

Manuel Damas disse...

Olhe Patrícia, também é a primeira vez que vou votar...no SIM! :)
Mas preocupam-me os resultados.
Se a pré-campanha está a correr tão mal, o que será a campanha?!
E quando há muito ruído...o povo afasta-se!

Manuel Damas disse...

Quanto mais ruído houver, Cristina, menos gente irá votar.
E isso poderá complicar as questões...