domingo, 11 de março de 2007

A TRISTEZA PORTUGUESA...



Somos um povo com idiossincrasias...
Neste canto lusitano que deu “novos mundos ao Mundo” a população foi evoluindo, ao longo dos tempos, idolatrando o Fado, com tudo o que isso implica. Não tão sorumbáticos como os sicilianos fizemos, todavia, questão de ser um povo fechado, pouco adepto de extravasar emoções...
Os portugueses carregam às costas o peso da sua ancestralidade!
Parecem reféns do Destino e, tal anátema impede-os, sócio-culturalmente, de cantar e rir, despreocupados, manietados pelo peso e pelos anátemas da modernidade, agrilhoados ao peso asfixiante de uma civilização europeia, envelhecida pelos mitos e pelos estereótipos, não conseguindo descolar do perfil da latinidade.
Continuamos a viver irreversivelmente condicionados pela maldição do «Velho do Restelo»... tão distantes que estamos e somos dos «primos» brasileiros que se deleitam com o sabor da vida, estimulados pelo samba e pela caipirinha.
Refugiados no Fado, iludidos no Futebol, adeptos do Folclore e da Tourada, parecemos querer continuar a pagar, enquanto povo, o peso do pecado original.
E o direito aos Afectos?
E o direito ao Prazer?
E o direito à Felicidade?
Achamos não ser para Nós!
E carregamos o peso de uma responsabilidade que não é nossa, em exclusividade...
À pergunta «Como vai?»... respondemos invariavelmente «Vai-se indo.»; «Como está?»... «Mais ou menos», envergonhados e receosos de que alguém descubra a nossa individualidade e, por causa disso, sejamos olhados, apontados, criticados e cobrados...
Mas porquê?
A Felicidade não paga imposto!
O sorriso e a gargalhada são humanos e gratuitos e é a altura de assumir que o peso da credibilidade não se atinge, obrigatoriamente, com posturas rígidas e encurvadas, com contenção das emoções e assepsia nos afectos.
É o direito ao prazer, de que falava Marguerite Yourcenar nas «Memórias de Adriano».
O lenço e o xaile, invariavelmente pretos, que tradicionalmente ilustravam a imagem da varina que, desesperada no areal deixava o olhar, perder-se no infinito, aguardando angustiada o regresso a bom porto do seu amado, não são inevitabilidades.
Até porque, a portugalidade não tem que ser sinónimo de dor, esgar e sofrimento.
O direito ao prazer é universal e Portugal é membro, de pleno direito, desta Aldeia Global.
As emoções e os afectos são realidades, acessíveis, que podem e devem ser assumidas, vivenciadas e saboreadas, não sendo a ordem dos factores aleatória.
Se o afecto existe, se o amor é, urge assumi-lo. O prazer está implícito e não tem que ser usufruído de forma inconfessável e escondida, qual penitência para o pecado de sonhar ser feliz.
O direito ao prazer deve ser assumido, vivenciado, sem mitos nem falsos pudores.
O Velho do Restelo saído da pena do poeta, aí deve ficar confinado, sem oportunidade para se tornar realidade nacional.
Até porque...
A tristeza não nasceu portuguesa.
As lágrimas não são Portugal...
in "O Primeiro de Janeiro", a 11/3/2007

4 comentários:

Cristina disse...

Adorei,professor. Como adoro tudo o que escreve. Sempre determinado em mostrar-nos que as emoções não devem ser escondidas, afinal somos todos seres de afectos.
Por vezes tenho a sensação que estou cá mas não deveria ter sido aqui que deveria ficar,muito embora adore cada canto de Portugal.

Manuel Damas disse...

As emoções devem ser vivenciadas, com frontalidade, sem medo de as assumir!

tb disse...

Concordo em absoluto!
Como teríamos um mundo melhor se a liberdade dos afectos fosse uma realidade...

Manuel Damas disse...

Se a liberdade dos afectos fosse uma realidade, tb, nada do que se passa aconteceria!As pessoas têm direito a vivenciar os seus afectos em liberdade, em dignidade, em tranquilidade.