domingo, 23 de setembro de 2007
PORQUE FALAR DE SEXUALIDADE?
“Porquê falar de Sexualidade”?...A pergunta rebentou-me na face, de forma inesperada, furiosamente ríspida e agressiva.
Porque se relaciona com a gestão das emoções, respondi titubeante, ainda surpreendido com a questão e com a forma como tinha sido lançada.
“Porquê falar de Sexualidade”?...Ecoou de novo, aumentando a intensidade e o poder penalizador da interrogação.
Porque se direcciona para a integração dos afectos aleguei, perplexo e inquieto.
“Porquê falar de Sexualidade”?... Interrogou, novamente, rasgando o ar, em riste e acusador.
Porque abrange o que de mais íntimo cada um tem e sente, repliquei, já discretamente indignado com a situação. Parecia um tribunal onde eu era o pretenso arguido e me debatia, tentando argumentar.
“Porquê falar de Sexualidade”?...Invectivou violentamente, quase gritando.
Porque se prende com o peso asfixiante daquilo de que não se fala!
Porque aborda o “sector proibido”, tentando esclarecer as dúvidas, imensas, que todos sentem e têm.
Porque é uma área que, quando referida, normalmente o é de forma superficial, quase asséptica, propositadamente coberta por uma capa, pretensamente protectora mas também isolante, de suposto cariz científico.
Porque existe um conjunto de conceitos, já preconceitos, convenientemente errados, de etiologia sócio-cultural, que urge serem corrigidos e a verdade reposta.
Porque se continua a propagar uma série de supostas verdades, pesadas porque falsas, que tentam influenciar e condicionar o modo de sentir e de agir de cada um, enquanto entidade individual e de todos colectivamente.
Porque em pleno século XXI se alardeiam, ainda, mitos infundados, autênticos dogmas que, por inquestionados, tentam subverter a realidade.
Porque ainda hoje se tenta difundir uma versão estereotipada, indiscutida e indiscutível que, possuidora de um cariz supostamente universal, exclui e marginaliza todos aqueles que a tentam questionar ou contestar.
Porque, cada vez mais existe o direito à felicidade sem que esta tenha que seguir, obrigatoriamente, os ditames que uma sociedade, supostamente global, decidiu impor!
Porque a Sexualidade não tem que ter, como finalidade única, a procriação, como certos sectores, de forma quase fundamentalista, ainda hoje fazem questão de propagandear.
Porque o ser humano tem direito a amar e ser amado em plenitude, independentemente de gostar do amarelo às riscas, do laranja aos quadrados ou do castanho às pintas.
Porque a Sociedade tem que abandonar a suposta crença, até porque errónea e infundada, de que tem o direito e o dever de aconselhar e de condicionar as diversas manifestações da vivência dos afectos...atirei, já esbracejando, não por me achar sem razão ou sem capacidade argumentativa mas, revoltado por ainda ser necessário explicitar aquilo que considero, desde há muito, uma flagrante evidência.
Num ímpeto mais ardente atirei-me, destemperada e emotivamente para a frente e, de repente, fiquei sentado, na penumbra do meu quarto.
O coração, agitado, ribombava no peito, parecendo querer explodir...
A respiração sibilava arfante e eu suava e tremia, de fúria e de revolta, por me sentir incapaz perante a sobranceria grosseira de quem me interrogava acintosamente.
Afinal eu não estava a ser submetido a um julgamento... estava na cama e tinha sido um pesadelo.
Maldito jantar, tentei racionalizar.
Mas tinha sido muito mais do que uma hipotética digestão mal conseguida... Era a consciência que me alertava para o peso da responsabilidade da nova janela de oportunidade que para mim se iria abrir, usando, desta vez, como instrumento, a mais poderosa arma ao dispor do Homem...a televisão.
Manuel Damas in "O Primeiro de Janeiro" a 23/9/2007
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12 comentários:
Antes de mais, escreveu um texto fantástico.
Quando assumimos uma atitude de ruptura em relação a uma linha de pensamento ou até dogma, tal como sucede com o modo como a sexualidade é encarada por cidadão comum, é normal encontrarmos sempre oposição e barreiras. Acima de tudo, temos sempre um número incontável de "Velhos do Restelo" a barrar as portas e colocar entraves a tudo que seja mudança. Tudo que implique mudanças de mentalidades, independentemente do assunto de que se trata, é sempre um processo moroso e, penoso. Acho que é essa morosidade que faz com que certas opiniões ou a aceitação pelo ser humano de certas "novidades", seja bem sedimentadas. Porém, é pena quando isso demoro tempo demais. No caso de Portugal, as mentalidades mudam a passo de caracol.
Acima de tudo, acho que a sexualidade é a forma de interacção humana mais primária. É a mais primitiva forma de comunicação e transmissão de afecto.
Pelo menos é assim que a vejo...
fantástica crónica professor! muito bem concebida! e espero que nunca deixe essa sua luta para repor a verdade que tanto esta sociedade necessita!
Obrigado pelos elogios...Convido-o a assistir à primeira emissão do meu novo programa de televisão, "Sexualidades, Afectos e Máscaras"...obviamente o título deste blog, no "PortoCanal", à sexta feira à noite, às 0.30...
Espero que seja surpreendido de forma agradável...
Obrigado Patrícia!!!
Assim também eu espero...
Efectivamante, o Professor já está "possuído" pelo SAM Televisivo, afinal quem não estaria...? Há grandes expectativas, principalmente depois do sucesso radiofónico com outro programa do género, e esta crónica n'O Primeiro de Janeiro comprova a vontade e disponibilidade para... Acontecer(em).
Gostei bastante deste texto, Parabéns.
Já leu o que saiu no JANEIRO?
O problema é esse emso, Francisco!
É que eu já estou completamente possuído pelo programa...e já com as turbinas em aquecimento!!!!
Espero que não haja nenhum "over loading..."
Até porque...Não pode haver!
Prepare a caipirinha negra, a passadeira vermelha e...autógrafos...Nem pensar!!!!
:))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))
Já Jesus...Maria José...Falta o "resto":::
:)))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))
Mais uma bela cronica professor...
Gostei muito
Obrigado, Joana.
Eu sei que sim Professor, como o entendo... Good Luck (no Essências)
Bem...vou ter que lá ir ler mesmo...
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